Durante
séculos o homem viajara pelo interior do Sistema Solar, estabelecendo bases
definitivas na Lua, em Marte, em Ganimedes e em Titã, o satélite de Saturno.
Aprendeu muito, sem dúvida! Aprendera sobretudo uma coisa – evidente antes do
evento generalizado dos satélites artificiais: a vida humana é curta e as
distâncias galácticas não se compadecem disso. Mesmo no interior do sistema
planetário, as viagens até aos mais remotos planetas, levavam anos, senão
décadas! Encarar a perspectiva de demandar outros mundos doutras estrelas,
levá-lo-ia a ter de tornear a dificuldade de permanecer longe da Terra, durante
séculos ou milhares de anos.
Teria
o homem de ficar para sempre confinado fisicamente ao seu próprio Sistema
Solar? Seria essa a verdadeira dimensão de si mesmo, a sua única missão
cósmica? Ou seria possível vencer o tempo e a distância? Os astrónomos, os
astrofísicos e os engenheiros espaciais julgavam que sim. Mas - essa
era a convicção de muitos -, teria de decorrer mais um
milhar de anos, até que fosse possível viajar para as estrelas.
Quanto
tempo tinha passado desde a certeza da possibilidade de viajar no mar-oceano, no século XIV, de Lisboa a Calecut, até que, tal,
viesse
a acontecer? Quantos cabos tinham sido
vencidos, quanta tormenta, quantos monstros do limite dos horizontes, "quantas
lágrimas vertidas no mar salgado!..." ?
Os
ensinamentos do passado, contadas ou descontadas as suas verdadeiras proporções
- e
aqui a relação entre essas proporções era gigantesca -, ajudavam-no, mesmo
assim, a alimentar esperanças; mas também a ter receios fundados. Os navios que
cruzavam os mares, desde Cheng Ho e os Indonésios, no Oriente, passando
pelos Cartagineses, os Fenícios e o mítico Ulisses, ou as naus do Gama e do
Magalhães, acabando nos mais velozes paquetes que redescobriam os encantos dos Mares
do Sul e a brancura ácida da Antárctida, ou os aeroplanos que desde o
capitão Wright até aos ultra-sónicos capazes de dar a volta ao Mundo em poucas
horas, pouco serviam -
apenas o suficiente, para os eternos sonhadores do mirífico...-,
para induzir suposições, neste contexto. Uma coisa é navegar pelo fluido azul
da concha do mar e do céu, e mesmo pelo circunscrito espaço interplanetário, a
outra é enfrentar o vazio incomensurável dos desertos cósmicos! As primeiras
viagens pelo mar tinham sido feitas exactamente à dimensão do Homem, ao limite
das suas capacidades, da sua persistência e do seu querer; as galácticas,
exponenciavam exorbitantemente os limites humanos, não os da razão e da
vontade, mas os do corpo perecível feito de água e cinzas.
Para
que fosse possível viajar para as estrelas, teria de ser resolvido o problema
da velocidade - o
que não parecia difícil - e o problema da capacidade
biológica em resistir a acelerações prolongadas muito superiores a 1 g. Aqui residia a principal
dificuldade. Para torneá-la teria de ser construída uma nave descomunal, onde
fosse possível - de
uma maneira ou
outra
- recriar
a gravidade e as demais condições ambientais da Terra e dar-lhe autonomia para
centenas, senão milhares de anos. Este tipo de nave seria um autêntico planeta
ambulante.
Tecnicamente
-
diziam os cientistas -
seria possível. Requeria apenas tempo e dinheiro. Como a pirâmide de Keops ou a
Muralha da China.
Se o tempo não
era
grande obstáculo para os técnicos (mesmo
se uma tal nave tivesse de levar cem anos a ser construída e os seus
arquitectos não pudessem jamais admirar essa maravilha última), outro tanto não se passava
com o dinheiro. Nenhum dos mais poderosos bancos ou consórcios multinacionais,
nenhuma das nações mais ricas, nenhum dos mais excêntricos milionários se
mostravam disponíveis para investir somas astronómicas ... de que nem bisneto
nem trisneto haveria de ver os resultados - se
os visse!...
Os
progressos técnicos conseguidos nas últimas décadas -
enquanto a Eratóstenes seguia pelo deserto sideral na direcção da
Estrela de Barnard - já
permitiam que uma moderna nave realizasse o dobro da viagem em menos de 75
anos. O ganho era significativo. Não obstante, esses avanços estariam em breve
confrontados com a impossibilidade físico/matemática de se ir mais longe, no
aumento da velocidade. E por consequência, na redução do tempo das viagens.
Enquanto não fosse possível dar o salto qualitativo e operar um novo meio de
propulsão, pouco haveria a esperar. A evolução para um grau superior de
combustível - a
aniquilação da matéria pela antimatéria, por exemplo -
requeria séculos de investigação, até tornar-se exequível.
Mas era tempo de pensar em imigrar,
e nada custava, desde logo, enviar uma sonda a Eridanus para plantar relva,
nabos e árvores.
.
em A FEBRE DO OURO, pág 95
Muito interessante! Mesmo.
ResponderEliminarBeijo grande