os EXTRATERRESTRES
domingo, 4 de janeiro de 2015
MARINHEIRO
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quinta-feira, 2 de outubro de 2014
A CHEGADA AO NOVO MUNDO
Nenhum
daqueles locais se prestava a um desembarque útil, de forma a avançar para o
hinterland. Contudo, passada uma meia hora, acabaram por fazê-lo, à falta
de melhor alternativa. O capitão decidiu tentar a sua sorte, ao aparecimento da
primeira praia: uma pequena concha (a imagem sempre presente da sua concepção
cosmológica...), como um bivalve lamelibrânqueo incrustado na rocha, levemente
inclinado para diante, que tinha o ar apetecível dum oásis no deserto. O
deserto era todo o resto da costa; o paraíso deveria ser lá cima, no meio das
terras, conquanto se apresentasse tão emaranhado e tão espesso - onde apenas se distinguiam aquelas árvores singulares
-, que poderia transformar-se num inferno verde e
sufocante, nunca imaginado. Tomou assento num batel, com mais quatro dos seus e
o biologista, e pouco depois saltavam em terra. Assim feito, ensaiaram o ritual
antigo, dando graças ao oiro do Sol, por terem chegado; mas a cerimónia
desluziu-se na exiguidade da pequena concha de areia. Logo ficou claro que era
impossível subir por ali acima, pela garganta delgada que levava ao topo das
rochas, donde escorria um fino veio de água.. Mas dela beberam deliciados, no
melhor sabor de Sócrates, estonteados de ter os pés em terra, após tantos dias
do balanço dos mares. E por aí se ficaram. Nem era possível fazer aguada,
pela insuficiência do veio de água e mormente pela dificuldade em manobrar
pipas ou tonéis, naquele lugar.
em A FEBRE DO OURO, Pág 43
em A FEBRE DO OURO, Pág 43
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sábado, 6 de setembro de 2014
DOCUMENTÀRIO "AO VIVO"
Entretanto, a convicção generalizada (o secreto desejo, mais propriamente...) era de que se iria presenciar um
espectacular documentário, ao vivo, sobre plantas e animais exóticos. Ou (aqui
a esperança era ainda mais secreta), de que se iria assistir a um cenário de
ficção científica, com enredos improváveis ou impensáveis, protagonizados por
"não humanos" que, mesmo sem protagonizarem nenhum enredo no sentido
terreno do termo, revelariam o sentido da vida, os desígnios últimos do Deus
(ou Deuses) da Criação. Era lícito imaginar fosse o que fosse: homnídeos
macacoides e outros, temerosos da noite, porventura evoluídos a partir de ramos estéreis da grande árvore genealógica que, na Terra, rejeitou
para fora do reino dos eleitos o nearthentalis e o cro-magnon,
incapazes de olhar para dentro de si mesmos, e para fora, para o alto, e
descobrir a atracção sublime das Estrelas; humanoides parentes (ou imigrados?)
de gnomos, elfos, os blemmyae ressuscitados por Sheakespear, entes de
pé-de-cabra, cinocéfalos que respiram fogo, ou astomi, sem boca,
cheiradores de odores; bípedes com cornos ou unicornes, parcas, lobisomens,
valquírias, bruxas nojentas como baratas voadoras voando em vassouras saídas da
retorta dalgum alquimista em desespero de causa; querubins, semideuses menores,
romanos ou gregos; deídes arqueológicas votadas ao desprezo no Egipto ou na
Pérsia; tágides e sereias com que em tempos idos se recompensavam (ou se perdiam...)
guerreiros e navegantes; nereides, ciclopes da Odisseia e da Eneida,
serafins, diabos subalternos trabalhando por conta própria, a despontar para o
pensamento abstracto e já congeminando dramas de estarrecer, na terra e no mar;
criaturas outramente racionais ou infraracionais, de estruturas etéreas, quem
sabe se anjos, arcanjos ou demónios às ordens de outros Deuses e de outros Destinos
e - porque não? -, bichos menores ganhando foros de cidadania no panorama impar dos "sem alma".
Porém, uma vez desenrolados tais acontecimentos, projectados tais cenários (ou
cenários díspares, semelhantes ou dissemelhantes do que foi imaginado ou
inimaginado), seria de continuar a chamar-lhes ficção científica, ou ficção tout
court, olhando-os nos visores do planeta Terra?
Valia a pena esperar, que a espera era de ver o nunca
visto.
.
em A Febre do Ouro, pág 202
quarta-feira, 2 de julho de 2014
SINAIS DE "GENTE"
Passado o pasmo e o frenesim primevo
de ver-se em chão seguro, o sábio das coisas vivas tomou decididamente a
dianteira, comandando as operações e encaminhando o grupo direito a uma das
grandes árvores da vertente interior da ravina. E ao contrário do que alguns
supunham, o capitão deixou-se guiar pelo sábio e foi atrás dele. Ficou a ideia
de que se arrependera do anterior dito e que assim se penitenciava da sua
ofensa.
Quando chegaram perto, pararam todos,
soltando grandes admirações, ante a beleza escultural da árvore e o seu porte dominador
e altivo. Ela tinha qualquer coisa de fascinante. Teria uns bons sessenta
metros de altura, o tronco liso e duríssimo, onde os golpes de catana pouco
penetravam, um enormíssimo diâmetro todo igual de baixo a cima e uma copa
farta, pequena e redonda que figurava um cogumelo de linhas geométricas,
impenetrável aos raios de sol e à claridade que vinha do alto, tão espesso era
o emaranhado da folhagem. Uma coisa que muito admirou o biologista foi a
postura dos ramos, todos eles saindo lateralmente do topo do tronco, tal qual
os raios da roda duma carroça, formando-se a folhagem em abóbada quase
perfeita, no interior da copa. Aí se deteve uns momentos, fazendo um esboço da
árvore e tomando notas. Os outros exploradores avançaram até ao alto duma colina
próxima, donde se descortinava o resto da paisagem. A impressão deixada por
aquele colosso de linhas esculturais, mantinha-se na mente, mas era preciso
avançar. De resto, ainda antes do desembarque, já alguns se sentiam fascinados
pelas suas silhuetas destacando-se na mata dos rochedos costeiros do
promontório aonde haviam chegado.
Mal arribaram à crista do morro, todos
se estacaram petrificados de emoção, os queixos bicudos erguidos temendo e
desafiando o silêncio daqueles ermos, como figurinhas de barro cheirando a
vertigem do tempo e a singularidade insólita daquele momento único. Daí se
desfrutava uma vista impressionante que fez desenfrear a pulsação dos
presentes. Uma enorme planície quase completamente desbravada e calva, fazendo
a espaços lembrar o restolho duma seara, e centenas, senão milhares!, de
árvores dominadoras e esculturais salpicadas ao acaso pelo espaço aberto, até
perder-se numas outras longínquas colinas cobertas de verde-malaquite espesso.
Para a direita, o rio. Para além do rio, delimitando a margem mais afastada,
uma escarpa quase a pique, marcando o fim do promontório enorme, que só se
desvanecia no gris das serras.
- Aqui temos o primeiro sinal de
gente! -
exclamou o biólogo, contendo a emoção.
em A FEBRE DO OURO, pág 39
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quinta-feira, 1 de maio de 2014
4 bolas de prata
O caso era intrincado demais. Não era
possível saber de que eram feitas as esferas, nem para que serviam.
- Não me admirava nada... que fossem de prata...
- Quê?... - gritou o comandante. - Prata!?...
Para o geólogo dificilmente seria outra
coisa: crómio, aço inoxidável, ou alumínio, por exemplo... já que esse metal
nem era conhecido dos físicos (ou dos alquimistas?) do planeta da e de Eridanus. Por essas alturas, conheciam ainda menos elementos
que os sessenta com que o sábio Mendlief estabeleceu a famosa tábua que na
Terra traz o seu nome. Tampouco o mineralogista poderia referir a útil
manganina, ou a brilhante alpaca - a suprema mistificação da prata!... -, essa especiosa liga de cobre, zinco e níquel, com
que (muito presumivelmente... se me permitem...), um dia... uma certa burguesia
do planeta, pretenderá iludir com terrinas e garfos... a sua condição rasca,
mediana!...
- Prata?! - o capitão deu um salto, meio esgazeado - É isso! Prata!...
- berrou ele. E depois virando-se repentinamente para o cartógrafo. - A estrada de prata... lembra-se?
Um súbito mas diferenciado frenesim
invadiu os membros do grupo. Não era para menos, a situação em que se
encontravam, pese embora a rudeza e a ignorância dos marujos (e do próprio
capitão), gente de mais ferro e fogo do que de fascínio pelo etéreo, pelo maravilhoso desconhecido de mundos de outro
mundo.
Avançaram, pois, agora sem tantas
cautelas, hipnotizados pela ideia da prata, seus desígnios e proventos. Havia
que dar-lhe prioridade absoluta. O cartógrafo teve a sensação de sentir uma
súbita luva de veludo a passar-lhe pela cara, mas logo - científica e filosoficamente - considerou que isso era apenas um frémito de emoção a
perpassar-lhe pelos nervos superexcitados, ante a visão estonteante dum quadro
irreal. Para que quereria, aquela gente,
quatro bolas de prata, em cima duma árvore? Mas...seriam mesmo de prata, tão
resplandecentes, sem sinais de oxidação... ao ar livre?... Que estaria por
detrás de tudo aquilo? Fustigavam-lhe a cabeça, uma enormidade de pensamentos,
todos ao mesmo tempo, entrelaçando-se, revirando-se, sobrepondo-se em turbilhão
e, do caos organizado da resposta, pensou nos deuses: o supremo mítico, por
excelência. Pôs a hipótese dum templo. Mas porquê a prata - se de prata se tratasse... - e não o ouro reluzente que ofusca o olhar, como o Deus-Sol?... E porquê quatro esferas? Porque
não... uma só?... Uma só divindade, a que presidia aos destinos do Mundo onde
nascera? Seriam deuses menores... se é que de deuses se tratava?...
domingo, 5 de janeiro de 2014
CALAFATES
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"O horizonte está nos olhos e não
na realidade"
Angel Ganivert
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O resto da tarde foi de preparação para a
exploração nocturna.
Os calafates de bordo - que acumulavam com as funções de carpinteiros - foram os que mais trabalho tiveram: trabalho humilde,
de carpinteiro, de serrar tábuas e pregar pregos, mas tão importante, na
circunstância, como a ciência do grande pensador que foi o sábio que primeiro
mediu a dimensão do Mundo - embora errando profundamente, mas abrindo um espaço de crítica que
haveria de revolucionar o pensamento das gentes.
Consultado o sábio das pedras - conhecedor das técnicas das minas e dos metais - o capitão-mor ordenou que fossem feitos artefactos
tão rudimentares mas tão indispensáveis para a colheita das pepitas de ouro,
quanto o são as pás de madeira, os crivos com que passar a pente fino as areias
do rio e mais uns niveladores para rasar as ditas.
Foi uma grande azáfama. Um enorme
frenesim. A cada prego pregado, a cada tábua serrada, os navegantes associavam
a visão antecipada de um maná feito de ouro reluzente que lhes haveria
de dar a fortuna e o lazer deleitoso dos ricos e dos reis.
Tudo isto os nautas pensavam, na sua
grande confusão de pensar e imaginar, na crença que tomavam por certa, embora
ao capitão não saísse do espírito a visão que tivera horas antes, sob o sol
escaldante da ilha.
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em A Febre do Ouro, pág 112
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sexta-feira, 8 de novembro de 2013
A PEQUENA SONDA
- E se alguma coisa acontecer, não prevista... que seja
presenciada pelos... pelos nativos e que esteja fora do seu entendimento...
não será tido, por eles, como obra de deuses? Estou a lembrar-me, e já que você
citou uma série de manuscritos antigos, dos textos do Kattrasaritsagar,
da cidade celeste de Hiranyapura donde eram enviados veículos para a
Terra, das áureas e argênteas rathas voadoras, tripuladas por criaturas
extraterrestres que vinham estudar os humanos, dos Heloins bíblicos, do
famoso carro de David... ou da barca celeste de Vixvakarman...
para já não falar do... do ... deixe ver se eu consigo soletrar este nome bizarro...
tão comprido... como a sua própria antiguidade... Sa-mar-ran-ga-na-su- -tra-dhar, onde se descreve como Brama construía carros voadores... Não
será a S. Gabriel, para eles, os... os nativos... se for
avistada, bem entendido!... qualquer coisa como isto?...
- Esperamos bem que não aconteça nada não previsto...
A pequena sonda que descerá no planeta, também não tem poderes nenhuns para
interferir seja de que maneira for. Nem deverá ser vista. Operará apenas pela
noite... se houver gente. E mesmo que eles tenham qualquer sistema de
iluminação, como os existentes em certas cidades da Terra antes da descoberta
da electricidade, esse sistema deverá ser muito circunscrito. A sonda não tem
luzes nem holofotes... e não será visível! Não se ponha a imaginar um desses discos
voadores cheios de luzes que, de quando em quando, ainda são vistos por
ignorantes ou, como no passado, quando serviam de pretexto para influenciar o
Congresso Americano ou os parlamentares europeus, tendo em vista o
desenvolvimento de novas armas...
- Não, não! - disse a gorducha, com um esgar molestado, insinuando
a refutação dalgum tele-espectador que tivesse percebido que o velho o tomava
por parvo.
- A sonda não precisa de luzes para ver o caminho... - continuou o sábio, em tom paternal, mas simples. - Os seus sensores são capazes de distinguir os
acidentes do terreno ou da paisagem, com uma precisão milimétrica... Os eridanus não darão
por nada!...
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em A FEBRE DO OURO, edição Litoral, 2011, pág 197
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