domingo, 20 de maio de 2012

O OURO


O sábio deixava transparecer alguma curiosidade mas também justificada apreensão pela decisão final do capitão. A única linguagem coerente que lhe conhecia era a da persistência, contra ventos e marés, ou feita pelos argumentos da força e do fogo. Todos os seus raciocínios se engendravam a partir daí.
– O pior é se as esferas já lá não estão!... – reconsiderou, por fim, mortificado só de pensar que poderia estar errado.
E então disse para o geólogo, quase em segredo, que considerava muito a sério a sua hipótese.
Então o mineralogista piscou os olhitos redondos – que mais pareciam os dum camaleão – abriu o saco que levara consigo para a planície e, sem dizer palavra, tirou lá de dentro o calhau branco leitoso – que já antes mostrara na margem do rio – e colocou-o em cima da mesa, sem dizer palavra.
– Que é isso?
– Ouro! – informou o sábio.
– Ouro? – berrou o marujo, agarrando rapidamente a pedra e revirando-a, avidamente, por todos os lados. – É ouro, isto!? – perguntou, atirando-a a rebolar sobre a banca, na direcção do outro, com desdém.
Nunca lera as descrições de Heródoto sobre as grandes explorações do precioso metal, na Macedónia e na Grécia, nada sabia do trabalhão que dá colhê-lo nas minas de Jales e de Rand, ou no planeta maldito da ∂ de Capricórnio, jamais ouvira falar em bandos de garimpeiros miseráveis que esfarelaram montanhas de alto a baixo, na agreste Sierra Nevada, em Shasta, ou na Serra Pelada do Pará.. Só tinha ouvido falar do oiro das areias do grande deserto nordestino.
– Sim, Capitão!... Isso é ouro! – disse o sábio pausando as palavras. – Se olhar bem, há-de ver por aí uns minúsculos grãos amarelos... que não são outra coisa, senão o que o trouxe por cá...
O marinheiro estendeu o braço arquejante na direcção do bocado de quartzo – que jazia, informe e humílimo, do lado oposto da mesa – e agarrou-o de novo. Desta vez olhou-o com muita atenção, delicadamente, auscultando os mais íntimos segredos da pedra e por fim disse que sim, que via uns pontinhos brilhantes cravados nela, para, logo a seguir, se deter com a maior curiosidade e interesse sobre um quase imperceptível veio amarelo que se afundava em diagonal no âmago da rocha.
– Desembarcámos precisamente em cima duma mina de ouro, capitão! – informou o mineralogista, enquanto o sábio dos mapas a olhava, por sua vez, a rebentar de curiosidade.
em A FEBRE DO OURO, pág 65

1 comentário:

  1. Um excerto que nos traz muitas informações e põe em perspectiva a febre do ouro que tem atacado a humanidade.

    abraço

    Olinda

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