quarta-feira, 2 de julho de 2014

SINAIS DE "GENTE"


Passado o pasmo e o frenesim primevo de ver-se em chão seguro, o sábio das coisas vivas tomou decididamente a dianteira, comandando as operações e encaminhando o grupo direito a uma das grandes árvores da vertente interior da ravina. E ao contrário do que alguns supunham, o capitão deixou-se guiar pelo sábio e foi atrás dele. Ficou a ideia de que se arrependera do anterior dito e que assim se penitenciava da sua ofensa.
Quando chegaram perto, pararam todos, soltando grandes admirações, ante a beleza escultural da árvore e o seu porte dominador e altivo. Ela tinha qualquer coisa de fascinante. Teria uns bons sessenta metros de altura, o tronco liso e duríssimo, onde os golpes de catana pouco penetravam, um enormíssimo diâmetro todo igual de baixo a cima e uma copa farta, pequena e redonda que figurava um cogumelo de linhas geométricas, impenetrável aos raios de sol e à claridade que vinha do alto, tão espesso era o emaranhado da folhagem. Uma coisa que muito admirou o biologista foi a postura dos ramos, todos eles saindo lateralmente do topo do tronco, tal qual os raios da roda duma carroça, formando-se a folhagem em abóbada quase perfeita, no interior da copa. Aí se deteve uns momentos, fazendo um esboço da árvore e tomando notas. Os outros exploradores avançaram até ao alto duma colina próxima, donde se descortinava o resto da paisagem. A impressão deixada por aquele colosso de linhas esculturais, mantinha-se na mente, mas era preciso avançar. De resto, ainda antes do desembarque, já alguns se sentiam fascinados pelas suas silhuetas destacando-se na mata dos rochedos costeiros do promontório aonde haviam chegado.
Mal arribaram à crista do morro, todos se estacaram petrificados de emoção, os queixos bicudos erguidos temendo e desafiando o silêncio daqueles ermos, como figurinhas de barro cheirando a vertigem do tempo e a singularidade insólita daquele momento único. Daí se desfrutava uma vista impressionante que fez desenfrear a pulsação dos presentes. Uma enorme planície quase completamente desbravada e calva, fazendo a espaços lembrar o restolho duma seara, e centenas, senão milhares!, de árvores dominadoras e esculturais salpicadas ao acaso pelo espaço aberto, até perder-se numas outras longínquas colinas cobertas de verde-malaquite espesso. Para a direita, o rio. Para além do rio, delimitando a margem mais afastada, uma escarpa quase a pique, marcando o fim do promontório enorme, que só se desvanecia no gris das serras.
- Aqui temos o primeiro sinal de gente! - exclamou o biólogo, contendo a emoção.
em A FEBRE DO OURO, pág 39

1 comentário:

  1. Venho para deixar te um abraço amigo poeta.
    Um abraço da amiga..Evanir.

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