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"Vindos uns dos outros, os habitantes
das diversas ilhas, sofrem de algumas
modificações
no
decurso da sua descendência"
Darwin (1868)
.
Nessa mesma noite, o capitão-mor mandou
içar as velas, levantar ferro e zarpar. Invadia-o uma profunda tristeza e uma
grande frustração. Como tinha sido possível tudo aquilo? Sentia a cabeça a
andar à roda, uma navalha cortante de angústia que lhe subia do peito, um vazio
que lhe apoderava o corpo e o imaterializava. Nunca, em tempo nenhum,
experimentara uma sensação tão cruel de derrota, um desespero de alma, tão
miserável e fundo, no ápice das grandezas que sonhara. O destino lhe
despedaçara as certezas mais claras, o deslumbramento mais límpido. Vira o oiro
como nunca vira ou imaginara. Tivera-o a seus pés. Tomara-lhe o peso e a
embriaguez. Fascinara-se da sua realidade tangível. E perdera-o para sempre..
De onde em onde parecia que o sangue frio voltava, que a força interior
dada por tantas perigos antes corridos e vencidos em guerras e tenebras, lhe
aligeirava a angústia. Mas logo, quando retratava aquele rio cheio de oiro e o
fantasmagórico lapso de tempo onde tudo ficou perdido sem remédio, sentia
vontade de chorar -
uma grande e inexplicável vontade de agarrar-se a alguém e chorar, num choro
inconsolável de criança inocente e infeliz. Não se lembrava de ter-lhe
acontecido uma coisa assim, na sua vida! E já tinha passado por tantas
balbúrdias e desastres! Tantos sonhos e pavores! Tanta mágoa e morte! Já tinha
visto outros dos seus homens perecer nas sangrentas batalhas navais contra as
gentes do Norte -
aquando da Guerra da Independência -
entre a fumarada das bombardas e a algazarra das manobras, entre sangue e
sangue, entre alcazins e raiva. Vira o primeiro e formoso veleiro que comandara
afundar-se a poucas braçadas da costa, despedaçando-se contra rochedos
familiares, sem, contudo, poder evitá-los, desgovernado e à deriva, pela fúria
inaudita do vento e mar, sem deuses ou demónios que o pudessem valer; já mesmo,
duma vez, se deixara infantilmente apanhar, desarmar e acorrentar que nem um
rato, sentindo uma grande vergonha surda pela humilhação a que fora sujeito.
Mas nada parecido com aquilo! Haver desembarcado, por milagre ou acaso, mesmo
em cima duma mina de oiro e não poder arrancar-lhe senão meia dúzia de míseras
pepitas que acabaria por perder na desordem da debandada, quando parecia ter a
fortuna e a glória a seus pés! (…)
O fracasso quebra as almas pequenas e engrandece as grandes, assim como o vento apaga a vela e atiça o fogo da floresta.
ResponderEliminarBenjamim Franklin
Beij0