segunda-feira, 7 de maio de 2012

OUTRAS ILHAS


 (...)
– Estive a pensar a noite inteira... – confidenciou o marinheiro. – Partimos de uma base que poderá ser falsa. A terra para onde os pássaros vão, pode não estar para Sul... – repetiu, com desalento. – Deveríamos ter visto se achávamos sinais dos pássaros, na ilhota... Se encontrássemos penas às cores...
Tal e qual. Teria obviado as insónias da noite anterior, ter agido em tempo útil; mas disso não era ele capaz fora, do seu pelouro de fluidos e ventos.
Então, o cartógrafo sacou do bolso duas peninhas regímenes duma avezita, amarelas e vermelhas, que colocou nas mãos do atónito marujo.
– Aí tem a prova! Os pássaros do Reino estiveram no rochedo... há bem pouco tempo!... Estamos, portanto, no bom caminho...
Por essa não esperava o capitão. Mirou as penas, com alvoroço e alívio, ao reconhecer não serem de aves marinhas e perguntou com ingenuidade:
– Onde as encontrou?
– Na Ilha dos Pássaros, naturalmente...
Por desgraça, o mercador não o informara do testemunho do seu malogrado antecessor, talvez por ter achado desnecessário. Ou por receio de que os navegantes, não tendo a sorte de encontrá-las... se desmotivassem.
– Oiça, vou dizer-lhe uma coisa que ninguém sabe...
O marujo sentia-se mal na pele. Olhou-o, procurando entender o emaranhado dos seus raciocínios e, por momentos, sentiu-se prisioneiro do cartógrafo e daquele mar-oceano que pareciam apoderar-se de todas as suas forças íntimas, do seu conhecimento e do seu querer. Que mais lhe iria dizer o velho?
– A conclusão é óbvia, meu caro... – o cartógrafo rebolou as bolitas dos olhos, num trejeito esperto. – Se os pássaros seguem para sul... há outras ilhas...
– Outras ilhas?...
– Sim, outras ilhas. Tanto faz que naveguemos para Leste, Sul, Oeste... Ou mesmo que tivéssemos navegado ainda mais para Norte... desde o Reino do Norte!...
Segundo esta concepção – pela primeira vez se estabelecia um verdadeiro conceito planetário – a ilha dos Reinos seria uma espécie de "umbigo do Mundo", donde partem as quatro direcções do Universo, em Tenochtitlan – arrasada pelos conquistadores espanhóis do século XVI... –, onde o nível celeste tem treze céus. Ou as mui antigas "quatuor habtationes vel insular" de Marcóbio, que sabiamente prediz a existência de quatro continentes/ilhas, na Terra. Aqui, na Eridanus, o planeta teria quatro mares. Mas o México pré-colombiano estava longe no tempo e no espaço, e o Sábio Primeiro medidor do Universo levava-lhes a palma neste aspecto. Já admitia a pluralidade dos céus, equivalente ao número de estrelas da concha de cima...
– Haveremos de encontrar novas ilhas... novos mundos... 
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A FEBRE DO OURO, pág 153

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