(...)
– Estive a pensar a noite inteira... –
confidenciou o marinheiro. – Partimos de uma base que poderá ser falsa. A terra
para onde os pássaros vão, pode não estar para Sul... – repetiu, com desalento.
– Deveríamos ter visto se achávamos sinais dos pássaros, na ilhota... Se
encontrássemos penas às cores...
Tal e qual. Teria obviado as insónias da
noite anterior, ter agido em tempo útil; mas disso não era ele capaz fora, do seu
pelouro de fluidos e ventos.
Então, o cartógrafo sacou do bolso duas
peninhas regímenes duma avezita, amarelas e vermelhas, que colocou nas mãos do
atónito marujo.
– Aí tem a prova! Os pássaros do Reino
estiveram no rochedo... há bem pouco tempo!... Estamos, portanto, no bom
caminho...
Por essa não esperava o capitão. Mirou as
penas, com alvoroço e alívio, ao reconhecer não serem de aves marinhas e
perguntou com ingenuidade:
– Onde as encontrou?
– Na Ilha dos Pássaros, naturalmente...
Por desgraça, o mercador não o informara do
testemunho do seu malogrado antecessor, talvez por ter achado desnecessário. Ou
por receio de que os navegantes, não tendo a sorte de encontrá-las... se desmotivassem.
– Oiça, vou dizer-lhe uma coisa que ninguém
sabe...
O marujo sentia-se mal na pele. Olhou-o,
procurando entender o emaranhado dos seus raciocínios e, por momentos,
sentiu-se prisioneiro do cartógrafo e daquele mar-oceano que pareciam
apoderar-se de todas as suas forças íntimas, do seu conhecimento e do seu
querer. Que mais lhe iria dizer o velho?
– A conclusão é óbvia, meu caro... – o
cartógrafo rebolou as bolitas dos olhos, num trejeito esperto. – Se os pássaros
seguem para sul... há outras ilhas...
– Outras ilhas?...
– Sim, outras ilhas. Tanto faz que
naveguemos para Leste, Sul, Oeste... Ou mesmo que tivéssemos navegado ainda
mais para Norte... desde o Reino do Norte!...
Segundo esta concepção – pela primeira vez
se estabelecia um verdadeiro conceito planetário – a ilha dos Reinos seria uma
espécie de "umbigo do Mundo",
donde partem as quatro direcções do Universo, em Tenochtitlan – arrasada pelos
conquistadores espanhóis do século XVI... –, onde o nível celeste tem treze
céus. Ou as mui antigas "quatuor
habtationes vel insular" de Marcóbio, que sabiamente prediz a
existência de quatro continentes/ilhas, na Terra. Aqui, na Eridanus, o planeta teria quatro mares. Mas o México pré-colombiano
estava longe no tempo e no espaço, e o Sábio Primeiro medidor do Universo
levava-lhes a palma neste aspecto. Já admitia a pluralidade dos céus,
equivalente ao número de estrelas da concha de cima...
– Haveremos de encontrar novas ilhas...
novos mundos...
.
A FEBRE DO OURO, pág 153
Existe sempre fartura para onde migram os pássaros.
ResponderEliminarBeijos!
Sucesso, querido amigo!Beijos!
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